Ciências Sociais Agrárias

Questão agrária – origens e atualidade

 

Ciências Sociais Agrárias e seu objeto de estudo

 

Questão agrária ou problema agrário é o termo usado abordar a entrada do modo de produção capitalista no campo. Essa expressão está relacionada à forma como esse modo de produção, com sua lógica incessante de busca do lucro, ao desenvolver-se, modifica a propriedade, a posse e a possibilidade de acesso à terra. Isso deve ser pensado considerando as características locais, regionais e mundiais desse acesso, já que muitos países capitalistas, principalmente na América Latina, concentram a propriedade da terra, e a possibilidade de posse está cada vez mais difícil. A questão agrária envolve, ainda, o modo de organização e divisão do trabalho no campo, a produção e a renda das pessoas que vivem de atividades agrícolas.

Sabemos que o modo de produção capitalista originou-se em atividades industriais ocorridas em cidades inglesas no século XVIII. As transformações decorrentes no mundo do trabalho e nas atividades econômicas ao longo daquele século e do século XIX não se restringiram às cidades e acarretaram mudanças significativas no campo, alterando o modo de vida de camponeses e de grandes proprietários de terra, transformando os acontecimentos verificados no campo em “uma questão”.

Particularmente na Inglaterra, berço da sociedade industrial surgida entre os séculos XVI e XVII, o aperfeiçoamento do maquinário, das técnicas de produção e da tecnologia empregada nas atividades produtivas favoreceu o êxodo rural. A industrialização, seguida da urbanização de localidades inglesas, passou a exigir maior quantidade de mão-de-obra para preencher as vagas de trabalho nas fábricas. No campo, a terra havia sido transformada em mercadoria e os agricultores em trabalhadores assalariados, no entanto, ao mesmo tempo que os camponeses se desvinculavam da terra, muitos ficaram sem ocupação.

Isso significa que os camponeses que antes desenvolviam trabalhos com a terra foram expulsos devido aos cercamentos (áreas que eram de uso dos servos no período feudal e que foram cercadas pelos senhores para a prática de monocultura, fazendo com que os camponeses fossem expulsos dos lugares de morada) e migraram para as cidades, onde se transformaram em operários das fábricas.

Sobre essa questão há outros aspectos sócio-econômicos importantes, mas vamos nos deter ao processo de industrialização e às mudanças na vida no campo.

Além do exemplo inglês, podemos citar o caso da França. A complexidade imposta pelo capitalismo ao campo nesse país pode ser entendida ao lembrarmos que quase toda a propriedade da terra estava em poder da Igreja e da nobreza, cabendo aos camponeses trabalhar pagando tributos para o senhor feudal (fato que caracteriza esse modo de produção). A burguesia, por outro lado, era uma classe social em ascensão, mas não detinha poderio político (somente econômico) e, juntamente com os camponeses, era um segmento da sociedade francesa dos mais explorados naquela época. Impostos e tributos eram abusivos, impossibilitando burgueses e camponeses de se desenvolverem social e economicamente. Essas duas classes sociais (campesinato e burguesia) se uniram e lutaram contra a monarquia na Revolução Francesa de 1789.

Após essa Revolução, com a derrota da monarquia, a burguesia consolidou o seu poder econômico e político, passando a orientar e comandar o desenvolvimento do capitalismo naquele país. Coube aos camponeses, diferentemente do que ocorreu na Inglaterra, dividir os antigos feudos e grandes fazendas dos senhores entre eles.

Esse processo de desenvolvimento do capitalismo no campo começou a ser discutido por historiadores e outros intelectuais a partir da expressão questão agrária, interessando-se pela forma como os países capitalistas organizam a sua estrutura fundiária e a produção de alimentos. Para isso, basta observarmos os exemplos dos países citados anteriormente e a contradição existente na ocupação de suas áreas rurais. Na Inglaterra, a terra foi tomada pelos camponeses e cercada para que o capitalismo se desenvolvesse.

A grande propriedade rural passou a ser a forma estrutural do campo inglês. Na França, a terra foi considerada livre para a ocupação de camponeses, que dividiram-na em pequenas propriedades rurais, já que tinham um pacto político com a burguesia. A estrutura fundiária francesa atual é reflexo desses acontecimentos, ou seja, as pequenas
propriedades rurais são a característica fundante do campo nesse país.

As particularidades históricas de cada país e a sua relação com as diferentes formas de desenvolvimento desse “novo” modo de produção – o capitalista – geraram diferenças na forma de organização do campo, bem como na constituição e na resolução do problema agrário. Poderíamos afirmar que há uma questão agrária para cada país, mesmo que o desenvolvimento do capitalismo nas áreas rurais tenha traços homogêneos de estruturação.

Outro fator que torna a questão agrária ainda mais complexa consiste na existência destes problemas na contemporaneidade. Isso significa que muitos países ainda não a resolveram. Soma-se a isso o fato de que os aspectos qualitativos desse problema mudam ao longo do tempo, como no caso brasileiro, onde a questão agrária aparece hoje como algo a ser resolvido mas apresenta diferentes características durante o processo de formação de nosso território.

Afinal, no que consiste, então, a questão agrária? Ela está ligada aos problemas decorrentes da forma como a propriedade e a posse da terra se efetivaram em cada país. E mais: se essa forma de organização fundiária constitui um obstáculo à produção de alimentos e ao desenvolvimento do capitalismo.

Num segundo momento, o problema fundiário aparece como uma questão política que pode ser resolvida pelos profissionais dessa área (presidentes, governadores, deputados) ou por meio de revoltas e revoluções sociais. O que verificamos em todos os países capitalistas desenvolvidos é que questões relacionadas à propriedade, posse e acesso à terra têm sido resolvidas por uma política relativamente mais justa de distribuição de terras a quem dela necessita. Esse processo, que é encaminhado pelos governos a partir de políticas públicas para o campo, ficou conhecido como reforma agrária.

Categorias: Agronomia, Ciências Sociais Agrárias, Educação, Geografia | Tags: , , , , , , , , , , | Deixe um comentário